Sim, é isso mesmo! Eu larguei o meu emprego pilotando grandes jatos em uma grande empresa internacional, um emprego dos sonhos para muitos como foi para mim. Voar era minha paixão e meu modo de vida por algum tempo. Comecei em pequenas aeronaves, depois consegui meu primeiro emprego como piloto de avião no Brasil voando Boeing 737 e finalmente uma carreira dos sonhos, internacional voando o Mundo em um Boeing 777 e foi aí que tudo ficou um pouco... confuso!
Como piloto, sempre buscamos nossa promoção e 11 anos se passaram desde que consegui minha posição como copiloto, sabia que me tornaria comandante em breve, tinha milhares de horas em jatos grandes e estava acima das qualificações para a nova função . Mas a pandemia veio no final de 2019, crises no ar, milhares de pilotos sendo demitidos todos os dias, os restantes lutando com unhas e dentes para manter seus empregos. Eu não fui demitido, mas estava trabalhando mais do que nunca e preso em hotéis ao redor do mundo, tive tempo para pensar.
Voar internacionalmente me trouxe uma perspectiva interessante do que era realmente valioso para mim. As longas horas no cockpit ou em quartos de hotel longe da família desempenham um papel em como você vê sua vida. A sensação de seguir com o fluxo estava se tornando minha realidade. Eu estava em um trabalho "bom", em um lugar seguro, com um caminho muito previsível e estável pela frente, onde eu trabalharia duro, ganharia dinheiro, teria os filhos nas melhores escolas e depois me aposentaria e seria feliz. O único problema: eu não estava feliz.
Claro que em casa todos estavam sentindo que eu não andavam muito bem. Tornei-me um reclamão e estar perto de mim não era nada fácil, mas em todas as férias tínhamos uma folga de todos esses sentimentos quando viajávamos para o nosso veleiro Trouble Maker. Toda vez que nós
estávamos na Croácia navegando por aquelas ilhas deslumbrantes, estávamos todos radiantes, tendo experiências fantásticas em família. Fazíamos parte da natureza que nos cercava e mais nos sentíamos conectados com nossas vidas. Foi aí que surgiu a ideia de morar em um veleiro.
Desde o momento em que me senti frustrado com a minha vida até a realização do nosso plano, houve uma jornada com muitos altos e baixos. Por termos experiência em ter barco e ficar a bordo conseguimos ver as coisas com mais praticidade. Também conversamos com muitas pessoas que moravam a bordo e tinham semelhanças com nossas idéias. Este foi um passo muito importante, ainda estávamos em nossos trabalhos normais mas explorando todas as possibilidades. Perguntas sobre o tamanho do nosso barco, educação em casa, medo do mar, trabalho, etc, surgiam todos os dias e noites e tivemos momentos de frustração e satisfação que aos poucos fomos entendendo.
Com a maioria das nossas dúvidas resolvidas, nos demos um bom período de férias para ir ao barco e ficar mais tempo do que o habitual, queríamos ver se realmente estávamos prontos para dar conta de tudo, com as crianças e com nós mesmos. Acho que foi uma das melhores coisas que fizemos. Depois de 3 semanas no barco eu questionei todo mundo e ninguém queria outra vida. Tudo acertado, era hora de lagar a profissão de piloto de avião.
Acabei me impressionando muito com o apoio da maioria dos meus colegas, comandantes e amigos. Mesmo não entendendo bem do que se tratava essa ideia maluca de velejar com a família, a maioria mostrou muito interesse e curiosidade. Esses momentos fizaram meus últimos meses uma passagem tranquila. Passei horas conversando com os meus amigos sobre os meus planos, consegui muitas perspetivas e alguns deles até começaram os seus cursos de vela!
O dia D foi interessante: acordei de manhã e tive aquela sensação de que deveria esperar um pouco mais, que estava pulando no vazio mas quando contei em casa quase me matam. No caminho para o escritório da empresa, eu sabia que isso seria uma virada nas nossas vidas. Entreguei minha carta de demissão e surpreendentemente me senti leve, estava novamente cuidando da minha própria vida. Liguei para casa com um grande sorriso, Eu Consegui!
Desde o momento em que me demiti até o dia em que partimos levaram-se 3 meses, esses foram os meses em que gostei de voar novamente, estava sem pressão e me despedindo daquele estilo de vida que conhecia há anos. Em casa estávamos vendendo nossas coisas e arrumando nossas malas. Tínhamos muitos documentos para organizar, muitos jantares de despedida e muitos amigos para dizer adeus. Todos choramos quando entramos pelas portas do aeroporto, mas assim que o avião pousou na Croácia, sabíamos que uma outra página de nossas vidas tinha acabado de começar.
Se você gostaria de discutir genuinamente a vida a bordo e experiências como a acima, não hesite em entrar em contato!
Tiago
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